Resenha Literária do livro Capitães
da Areia, de Jorge Amado.
“Amava o sol, a rua, a liberdade”
(AMADO, p. 186)
O romance Capitães da areia, de Jorge Amado, foi
publicado em 1937. O livro teve a primeira edição apreendida e
exemplares queimados em praça pública de Salvador por autoridades da ditadura.
A partir de 1944, quando uma nova edição é lançada, entra para a história da
literatura brasileira, assim como outros livros do autor, traduzidos para
outros idiomas e adaptados para rádio, teatro e cinema.
É um romance
modernista, pertencente à segunda fase do Modernismo no Brasil (1930-1945),
também conhecida como Romance de 30 ou fase Neorrealista, cuja narrativa aparece fortemente vinculada às
transformações políticas, sociais e econômicas do período. Pela primeira vez na história da literatura
brasileira, um escritor denuncia de maneira panfletária – romântica, e
paradoxalmente, socialista e realista – o problema dos menores abandonados e
dos menores infratores que desafiavam a
polícia e a própria sociedade.
Essa abordagem romântica se deve,
exclusivamente, ao fato de o autor
minimizar os delitos dos meninos e acentuar os defeitos da sociedade, nem mesmo
a Igreja ficou livre da censura do
autor. Por outro lado, Jorge Amado traz
para discussão a problemática desses meninos que não tiveram a felicidade de
ter uma família ou a felicidade de serem acolhidos pelo Estado que tinha
( e ainda tem) a obrigação de defendê-los de qualquer tipo de
marginalização.
Capitães da Areia
trata da problemática do menor abandonado e das suas consequências: a
violência, a criminalidade, a discriminação e a prostituição. A narrativa inicia-se com uma sequência de Cartas à
Redação do Jornal da Tarde - Carta do Secretário do Chefe de Polícia; Carta do
doutor Juiz de Menores; Carta de uma Mãe Costureira; Carta do Padre José Pedro;
Carta do Diretor do Reformatório - a fim
de debater as questões referentes a crianças que viviam do furto e infestavam a
cidade. São apresentados, logo em seguida, três capítulos: “Sob a lua num velho
trapiche abandonado”; “Noite de grande
paz, da grande paz dos teus olhos” ; Canção da Bahia, “Canção da Liberdade”.
No primeiro
capítulo, o leitor entra em contato com o universo dos meninos, suas tristes
figuras e suas histórias de vida. As principais personagens são: Pedro Bala, um
menino de quinze anos, que ganhou o
direito de liderança, após uma “briga de foice”. Loiro, com uma cicatriz no
rosto, passou a ser uma espécie de pai para os garotos. Tinha a autoridade
necessária para liderar o grupo, agilidade e, acima de tudo, tornou-se um
exemplo para aqueles meninos. O
Professor era uma luz na escuridão... era ele quem lia histórias de marinheiros,
de aventuras... trazia para a realidade
daqueles meninos a fantasia, que só a
literatura poderia proporcionar.
Gato
era o malandro, usava sua esperteza para conseguir “se dar bem na vida”, é o
explorador de mulheres. Sem-pernas era o ódio em pessoa. Desde pequeno
aprendera a odiar a tudo e a todos, até mesmo quando amava. Fingia-se de órfão
desamparado e se aproveitava de suas vítimas para roubá-las. João Grande era o
“negro bom” como dizia Pedro Bala. Pirulito, a fé. No segundo capítulo,
o leitor é apresentado à personagem Dora e ao irmão, que após perderem os pais,
vítimas da varíola, vão fazer parte dos Capitães
da Areia. No terceiro capítulo, após a morte de Dora, o leitor se depara
com grandes transformações. Dora partiu o coração de todos aqueles
meninos. A vida, no Trapiche, nunca mais seria a mesma. A vida precisava seguir
seu curso, alguns sonhos se concretizaram, outros foram, estupidamente, interrompidos. Pedro Bala, embora perseguido pela polícia de
cinco Estados como organizador de greves, como dirigente de partidos ilegais,
como perigoso inimigo da ordem estabelecida, transformou-se em herói de sua
classe.
“ ... E, no
dia em que ele fugiu, em inúmeros lares, na hora pobre do jantar, rostos se
iluminaram ao saber da notícia. E, apesar de que lá fora era o terror, qualquer
daqueles lares era um que se abriria para Pedro Bala, fugitivo da polícia.
Porque a revolução é uma pátria e uma família.”
(AMADO, 1983; p. 231)
Jorge
Amado, amado pelo público, incompreendido, muitas vezes, pela crítica - pelos
descuidos com a língua portuguesa, pela linguagem coloquial, pela forma
idealizada com que apresentava as suas personagens - será sempre lembrado como o escritor que
conseguiu manter um diálogo permanente e intenso com o público. Capitães
da areia, apesar de ter sido escrito há tanto tempo, continua atual. É o
que mostra o pesquisador literário, Eduardo Assis Duarte, a história daqueles
meninos continua a pontuar as páginas
dos jornais e da televisão, a mostrar que os problemas sociais, econômicos e
políticos persistem.
Quanto
a fogueiras e menores abandonados, a triste conclusão é que continuam a fazer
parte da história pátria. Os meninos passaram de “dominados” a “excluídos”,
apesar de frequentarem cada vez mais espaços públicos. Já as fogueiras, também
elas persistem. No alvorecer do milênio, desinteressaram-se aparentemente dos
livros. Voltam-se agora para os índios, mendigos e homossexuais. ( DUARTE, 204:
50)
Percorrer
as páginas do livro é um exercício de cidadania. Mesmo que seja, de forma
idealizada, Jorge Amado criou personagens envolventes, capazes de “abrir” os olhos do leitor, que se vê envolvido em cada história, que
reconhece um ou outro personagem nas páginas policiais. São heróis?
São bandidos? São vítimas? São
menores abandonados! É preferível
acreditar que são vítimas, vítimas da
marginalização a que são submetidos. Vítimas de um sistema que precisa,
urgentemente, mudar.
Maria Cristina Altvater Biagio
Maria Cristina Altvater Biagio
AMADO, Jorge. Capitães da Areia. 57
ed. Rio de Janeiro: Record, 1983.
DUARTE, Eduardo de Assis. Jorge Amado: leitura e cidadania. In: AMADO, 2004, p. 39-50.
Obs: Resenha feita para complementar o estudo das obras Literárias - Vestibular de 2013.
Obs: Resenha feita para complementar o estudo das obras Literárias - Vestibular de 2013.